21:05 p.m.
Ela se assusta ao ver as horas e
perceber que se não deitar-se logo, acordará mal no amanhã, percebe que seu dia
mais importante passou e nada fez de novo, fez muitas coisas sim, coisas até
interessantes, riu, aprendeu, mas no abismo insondável de si mesma sabe que
nada daquilo foi novo, a risada foi da mesma piada da semana passada, a lição
aprendida foi apenas uma recuperação de uma lição perdida de muito tempo atrás
e os fatos interessantes não passaram de quimeras destruída por um Belerofonte.
Já são 21:20...
A roupa que ela julga tão confortável
pro trabalho já está no seu balde de roupas sujas, como acontece em todos esses
mesmos dias há meses, a maquiagem saiu, como que por mágica, e foi substituída
pelo cinza da cidade que a cerca, o dinheiro separado para pagar a fatura, e todos os comprovantes em seus compartimentos, os peixes alimentados, a TV com a função sleep ativada em 30 minutos, os pratos de alumínio já estão no seu lixo,
que aliás, que está pronto pra ser deixado do lado de fora, onde o funcionário passará
a recolher o seu e o de todos deixando tudo na mais perfeita ordem, como
sempre.
21: 27... ordem?
A comida industrializada, o
acordar, o mesmo caminho de sempre, os mesmo olhares furtivos... Começou a
detestar sua vida no momento que percebeu que a ordem diária estava consumindo
sua energia, como uma vela que tenta manter-se luminária apenas com a ponta do
barbante boiando na parafina molhada no fundo de um pires velho...
Estava desesperadamente e contra
vontade virando mais uma página do seu diário interior, enquanto tomava seus remédios,
que a faziam esquecer que ela necessitava de remédios para esquecer que sua
vida era vazia, mas não, aquele dia não, aquele dia que ela nem sabia que dia
era não houve tempo de ingeri-los, não funcionariam mais, não entorpeceriam a
sua dor, que era justamente a dor por não sentir dor, nem nada mais.
21: 36
Olhando seu reflexo através de
sua vidraça blindex com 75% de transparência sua imagem se misturava com a
imagem a sua frente, uma selva em si se mistura à selva de pedra que se erguia
a sua frente, era exatamente isso, ela sabia que era um labirinto infindável de
sentimentos, razões e angústias, assim como aquele grande rede de esgotos,
ruas, prédios e telhados a sua vista, e que as duas não faziam mais sentido
ali, precisavam de novos ares.
Abrindo a janela o vento frio e o
ar pesado lhe invadem as temporas e vias aéreas como se passassem por dentro de
sua pele, era violento o baque sentido pelo seu corpo, porém as flores no seu
parapeito pareciam nada sentir, estavam inertes, elas haviam acostumado-se com
aquela violência sem corpo que as atingia a todo o tempo, haviam acostumado-se
e nem perceberam isso, ela percebeu, percebeu seu pacto com o vazio.
21: 42... Vazio...
Um pé após o outro sabe vagarosamente
no beiral e se aconchega entre as flores.
A TV ainda tem 8 minutos de vida...
Nenhum comentário:
Postar um comentário